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Música Antiga, Cidade [re]Nova[da]

Música Antiga, Cidade [re]Nova[da]
[escrito 04/09/12]
Terminou neste passado dia 2 de Setembro aquele que é considerado um dos maiores e mais proeminentes festivais de música antiga do mundo: o Festival de Música Antiga de Utrecht, nos Países Baixos (mais conhecido como Oude Muziek Festival Utrecht). A 31ª Edição têve início a 24 de Agosto e contou  com mais 50.000 ouvintes, num total de 190 concertos, palestras e workshops espalhadas por toda a cidade.

Utrecht, uma elegante e charmosa cidade neerlandesa de raiz medieval, serviu como pano de fundo para mais uma série de concertos dedicados à música antiga, também conhecida por música historicamente informada ou musica composta antes de 1800 (nas palavras do maestro Ton Koopman). Todos os anos na última semana de Agosto, afluem a esta cidade músicos, construtores de instrumentos, teóricos e amantes de música dita antiga. As muitas igrejas de índole protestante da cidade e.g. Domkerk, Jacobikerk, Pieterskerk, Geertekerk e a principal sala de concertos Vredenburg Leidsche Rijn, tornam-se os principais palcos de uma série de concertos de lotação quase sempre esgotada. O festival apresenta-se em formato maratona musical: as prestações a solo abrem e encerram o dia, com concertos pelas 13h e 00h, respectivamente. Os pratos fortes servem-se pelas 15h, 17h, 20h e 22h30, onde alguns dos mais prestigiados grupos de música de câmara e orquestras europeias apresentam os seus programas, este ano dedicados ao período entre Sweelinck e Bach, dois dos mais conhecidos compositores do estilo barroco, na Europa Central. De destacar também o Oude Muziek Markt, mercado especializado em instrumentos antigos e o simpósio ‘Much of what we do is pure hypothesis: Gustav Leonhardt and his Early Music’. Este último evento procurou homenagear um dos arautos do movimento que marcou o início da música antiga na Europa: o cravista Gustave Leonhard, falecido em Janeiro deste ano.

Uma das particularidades deste festival é a programação paralela - fringe - que procurar divulgar ensembles jovens no caminho da profissionalização. Estes concertos, de entrada gratuita, são uma dádiva do festival à cidade e um motivo para a descoberta da mesma, pela promoção de localizações inusitadas: um café, um pequeno teatro, um átrio de um museu, uma casa privada, um claustro… É o apanágio da ideia de gezelligheid, que promove o conceito de acolhedor, tão próprio da cultura neerlandesa.

Outra importante nota é a presença portuguesa. A programação principal este ano contou com três flautistas portugueses: Marco Magalhães e Filipa Pereira (Royal Wind Music, Países Baixos) e Tiago Simas Freire (Capriccio Stravagante, França). O tenor portuense Fernando Guimarães estêve também presente com Les Muffatti (Bélgica); A programação fringe contou também com Fernando Miguel Jaloto (cravo), Joana Amorim (traverso), Filipa Meneses (viola da gamba), José Gomes (fagote) e Maria Bayley (clavisimbalum).

Um dos pontos altos do festival estêve a cargo de Masaaki Suzuki & Bach Collegium Japan que  presentearam o público com uma selecção de Magnificats de Zelenka, Kuhnau e Bach. O concerto de encerramento ficou a cargo de Collegium Vocale Gent, sob a direcção de Philippe Herreweghe. Num panorama cultural que também nos Países Baixos atravessa fortes cortes orçamentais - mais de 70% das instituições culturais perderam apoio estatal este ano - é uma lufada de ar fresco ver que o Festival de Música Antiga de Utrecht continua a remar contra as vicissitudes políticas europeias actuais.

Daniela Tomaz
Licenciada em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto I Bachelor of Music in Early Music, Hogeschool voor de Kunsten Utrecht, Netherlands

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